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M80 Roteiro de férias 2020: Trás-os-Montes

A equipa M80 partilha consigo os lugares em Portugal que conhecem e recomendam para este Verão.

Anabela Gonçalves

Trás-os-Montes "fica no cimo de Portugal, como os ninhos ficam no cimo das árvores para que a distância os torne mais impossíveis e apetecidos", Miguel Torga em "Um Reino Maravilhoso".

Trás-os-Montes foi berço e mote para tantas palavras do Poeta que acabou por moldar o meu imaginário antes sequer de ter visitado esta terra. Foi assim que a curiosidade me transportou fisicamente para um amor que se viria a tornar inigualável. Mágica, extensa e dourada para mim. Eu que tenho a mania de dar cores aos locais por onde passo e desde as folhas das árvores à terra poeirenta ou ao pôr do Sol no Verão, tudo lhe confere uma preciosidade de tons de um dourado eterno. 

Ah Poeta!

Trás-os-Montes é assim Ouro quente, mas daquele acabadinho de sair da fornalha. Como o Mel e o Azeite que provêm desta terra.  No tempo frio é a riqueza das gentes que aquece o coração (e os pés na lareira de chão) pela nota 20 na disciplina de "bem receber" e que me leva até lá. Coberta de lã até às orelhas, é certo, mas até no Inverno rigoroso vale a visita. 

Paz, silêncio, natureza pura e hospitalidade genuína, e no Verão, festa rija em todas as aldeias para rasgar sorrisos e gastar energias (ou assim esperamos que aconteça no próximo que não este).

A região abarca os distritos de Vila Real e Bragança, e alguns concelhos dos distritos de Viseu e Guarda. Para já, deixo o Alto Douro para outros ensaios e fico-me apenas pelo Distrito de Bragança porque me é chegado ao coração.

A viagem até lá já é uma viagem no tempo. Por um paraíso plantado à beira do Douro ou outros rios que se cruzam e desaguam em si, entre montanhas de socalcos, vales e encostas de vinhas ou oliveiras e outros rios e lagos que vão mudando de cor como se as quatro estações ainda existissem. É pura poesia em tudo. E de Lisboa a Bragança já não são nove horas de distância, por isso, é ir!


Lamber os dedos

São vários os pratos típicos da região. Diz o povo que antigamente, na altura em que as estações eram mais severas, era preciso comer algo que enchesse o bandulho para poderem aguentar o trabalho pesado no campo. Uma Posta Mirandesa não deve pesar menos de meio kilo, certamente. Ocupa uma travessa inteira, é suculenta, macia e, diz quem a come, que é a melhor carne bovina do Mundo. 

A gastronomia é de fazer lamber os dedos e em quantidade para alimentar um halterofilista. Não há visita que não seja generosa num quilinho ou outro. Ou dois, ou três... depende do tempo que passar por lá. Eu que já pude jantar em família no  Restaurante Moagem João do Padre, em Podence, sei do que estou a falar. Parece que formos jantar a casa dos avós. "Comam, filhos, comam...". Aqui também se pode pernoitar. Depois tem outros de outro género,  diferentes e imprevisíveis, acolhedores e apetitosos na mesma proporção e muito especiais como O Lagar do Nicolau. Maravilhoso. 


Depois há os enchidos, as casulas, as alheiras, a feijoada transmontana, o folar de carne, os cogumelos e as castanhas ou os bolos de mel. Quer se goste mais de doce ou salgado, há para todos. Eu sou perdida de amores pelas bôlas sovadas e o queijo de cabra fresco da Quinta da Veiguinha. Nunca regresso a casa sem passar na Cooperativa de Alfândega da Fé para me abastecer das alheiras, do queijo e das bôlas. O que eu gosto daquilo!

Tradições

A região de Trás-os-Montes é uma das mais ricas em achados arqueológicos e podem encontrar-se vários vestígios da arquitetura romana. O folclore é riquíssimo e especial, e está bem vivo nos seus dialetos. Faz fronteira com Espanha e será também por esta proximidade que a Língua Mirandesa é o que ainda é. O Mirandês, nome oficial que recebe o asturo-leonês em território nacional, é cada vez menos falado. Contra a sua extinção Eimilho Pica dá lições divertidas aos garotos para que a tradição não se perca. Experimente. Eu própria já aprendi, Bô!

 

 

A tradição das Festas de Inverno que se estendem do Natal até ao Carnaval: a chocalhada pelos "caretos", a dança dos pauliteiros, a música ao som das gaitas de foles. Só vivendo, mas o Museu ibérico da Máscara e do Traje enche-nos os olhos dessa riqueza das gentes que a costumam trazer também à Capital no Festival Internacional da Máscara Ibérica (FIMI). Este ano ficamos pela visita ao museu. 


Paisagens

Quando se pára para respirar a paisagem e escutar o silêncio, o tempo também pára connosco. É é isso. Um Silêncio de se perder de vista para apenas contemplar. Entre a Rota da Terra Quente Trasmontana e a Rota da Terra Fria, a dificuldade vai ser decidir qual a estrada a percorrer e os dias que vai ficar.  Há toda uma região à sua espera. Em jeito de amostra sugiro em Urrós "O escondidinho", um dos miradouros que nos permite vibrar em eco, exemplo da beleza que se perde de vista por estas encostas. Há mais: Fraga do Puio, Picote. E outros. Experimente ouvir-se e perder-se a cada paragem. Se for mais apreciador de monumentos e da História, leve a câmara fotográfica porque os Castelos de Bragança e Mogadouro são pontos a visitar. 

 

 

Mergulhos

A Praia Fluvial da Ribeira e a Praia Fluvial da Fraga da Pegada. Ambas frequentadas durante toda a época balnear pela qualidade da água e infraestruturas, mas não só. Ambas na Albufeira do Azibo e de braços dados com o Parque Natural de  Montesinho são vigiadas, concessionadas e seguras e excelentes para levar as crianças (ou os garotos, como se diz por aqui).  Uma tem uma piscinas flutuante, a outra parque infantil, chuveiros de praia, WC e as acessibilidades para que todos, mas mesmo todos possam usufruir deste luxo no meio da natureza. Uma foi eleita uma das 7 Maravilhas-Praias de Portugal e a outra é considerada a Praia Fluvial da Europa com mais Bandeiras Azuis averbadas. Descubra a qual pertence cada galardão!

Para ficar 

Há uns bons anos fiquei na Estalagem ou Hotel & Spa Alfândega da Fé, na Serra de Bornes e na altura gostei muito. Aquele spa virado para a poesia do infinito é qualquer coisa. Mas na Terra de Trás-os-Montes fica-se muito bem seja onde for. Há opções para todos os gostos e para todas as carteiras. Para quem gosta de caravanismo ou campismo ainda pode usufruir dos vários parques de campismo existentes.


Para anotar na check-list

Se é aventureiro e gostava de experimentar voar num planador, ou seja, num avião sem motor - sim ele é rebocado e depois fica a planar como um papagaio (o que pode parecer um bocadinho assustador à primeira vista mas depois é espetacular) então o melhor é informar-se junto do Aeródromo Municipal de Mogadouro ou do Centro Internacional de voo à vela para quando poderá marcar essa experiência. Para já, sabemos que o Covid-19 limitou todas as atividades previstas para este ano, mas quem sabe o "bicho despega" e podemos voar?!

Entretanto, fique onde ficar, faça o que fizer, o importante é ir. Vá, porque Trás-os-Montes é terra de ouro e de amor. Única e acredite, indescritível. O que lhe contei vai parecer nada quando lá chegar. Depois conte-me.


Imagens de Anabela Gonçalves e Francisco Pinto.