Ouça a M80, faça o download da App.
Silvia Mendes
27 março 2020, 09:27
Partilhar

Cláudia Pascoal: "o meu álbum é um pacotinho de amor"

Cláudia Pascoal: "o meu álbum é um pacotinho de amor"
Cortesia Universal
Silvia Mendes
27 março 2020, 09:27
Conversámos com a cantora e compositora que lança hoje o disco de estreia. O álbum chega em tom exclamativo. "!" é um "statement", é a Cláudia e é o que quisermos que seja.

 

Cláudia Pascoal lança hoje o disco de estreia. A procura de um nome para um título do primeiro álbum acabou quando a leve e profunda Cláudia esbarrou na ideia de batizá-lo com um abrangente e chamativo ponto de exclamação. Um statetment? Uma exclamação aberta à interpretação de cada um? Um reflexo da Cláudia desdobrado em canções de exímio requinte pop? Pode ser isso tudo. Porque não? Certo é que, depois de ouvirmos os doze temas, exclamamos para nós: "Boa, Cláudia!!!". E de sorriso largo na cara. A cantora e compositora, de voz suave e espírito espontâneo, já não é só a menina do ukelele que emprestou a voz doce ao 'Jardim' do Festival da Canção. É a Cláudia Pascoal e com ponto de exclamação. 

"!" resultou de um bonito e coeso trabalho de equipa. Foi feito com um grupo de artistas que a cantora nortenha foi "recrutando" - com leveza e muita fé no processo - entre mensagens informais no Instagram e alguns encontros no café. Sim, quando ainda podíamos fazer isso. O elenco sonante de convidados foi escolhido a rigor, com respeito e amor, mediante três critérios: a popularidade nas escolhas de Cláudia no Spotify, fazer parte da família (e de um rancho folclórico) e ser... o Nuno Markl. Sim, Markl também está envolvido nesta história.

David Fonseca, Samuel Úria, Miguel Lestre (Prana), Joana Espadinha, Pedro da Silva Martins e Luís José Martins (Deolinda) ajudaram com algumas canções. Outras são da Cláudia. Tiago Bettencourt sentou-se na cadeira de produtor. Já o Nuno Markl ajudou à festa, sendo apenas o Nuno Markl.
 

Primeiro, quero saber mais sobre o título do disco. O que é que está antes deste ponto de exclamação?

Se tiveres algumas ideias para colocar antes da exclamação, estou aberta a sugestões. (risos) Não queria que fosse uma palavra e não queria que fosse apenas um título. Queria que fosse uma espécie de statement, do género: "aqui estou eu, finalmente sozinha, com o meu projeto e com as minhas ideias". Acho que a exclamação sou eu. Não há uma palavra antes nem depois, sou eu personificada num ponto de exclamação.

É o teu primeiro disco, como é que te sentes?

Às vezes, ainda dou por mim com o disco na mão e a pensar "como é que isto está a acontecer?". Não só tenho um álbum, algo que não imaginava ter, como tenho o disco que nunca sonhei ter, com os artistas que mais admiro e admirava quando era adolescente, músicos que agora são meus amigos. É um pacotinho de papel feito de amor, com um disco lá dentro. Ainda estou parva com isto tudo, com a forma como isto tudo aconteceu.

Estás orgulhosa e feliz…

Sim. Estou muito feliz com o disco.

Quando imaginavas o teu primeiro disco, que ideias esvoaçavam pela tua cabeça? Como é que o idealizavas?

Sempre quis que fosse mais que um par de músicas. Queria que tivesse um conceito com um envolvimento muito gráfico e estético. Também queria fosse humorístico. Acabei por convencer os que estavam a trabalhar comigo a dar um toque de humor ao álbum. Por exemplo, convenci-os a incluir um sketch com o Nuno Markl. Acho que esse traço reflete muito a minha personalidade. Além disso, acho que este disco também reflete muito o meu crescimento musical. Eu que nunca estudei música e fui tropeçando em alguns concursos de talento, finalmente, consegui ter um disco. Resumindo, reflete o meu crescimento, mas mantém as minhas bases humorísticas que vêm desde os tempos em que apresentava o Curto-Circuito. Acho que consegue ser uma caminha disso tudo. Quando pensava no que seria o meu primeiro disco nunca imaginei que pudesse ter o elenco que consegui para este álbum. Na altura, pensava que seria só eu e o meu ukelele. (risos) Acabou por correr tudo muito bem. Aconteceram coisas muito boas na criação deste álbum.    

Sei que querias criar um ambiente que fosse abrangente. Algo muito teu, mas que chegasse a todos. Tinhas essa intenção?

Eu disse isso? Estava cheia de ambições! (risos) Espero conseguir, pelo menos, uma boa parte desse objetivo. A verdade é que estou muito contente com o resultado final. Acho que conseguimos meter mais coisas no disco que aquilo que imaginei no início. Mas, acho que sim. É um disco para todos, sim. Uma criança e uma pessoa mais velha podem ouvi-lo e cada uma ter uma interpretação diferente do que ouviu, mas sei que ambas vão entender a mensagem que quero transmitir. Nesse sentido, é muito abrangente. Acho que toda a gente vai entender o que quero comunicar.

O humor está presente no disco, mas não é o único traço que o define. Também há reflexões e pensamentos mais profundos. "!" reflete sobre o quê?

É um disco com muitas canções de amor, algo que, ao início, queria evitar. (risos) Percebi depois que é inevitável. Acabamos sempre por escrever sobre canções de amor. Alguns temas que escreveram para mim também versam sobre o amor. No fundo, é uma parte muito importante da vida, não me arrependo. 

Em que medida é que cada canção reflete um pouco de ti? Por exemplo, a 'Espalha Brasas' tem o foco nas mulheres e acaba por abordar a questão da igualdade de géneros com leveza...

Para ajudar na composição dessa música, passei muito tempo ao telefone com o Pedro da Silva Martins. Era importante que ele me conhecesse melhor e que percebesse o que é que eu queria transmitir na canção. No final da conversa, depois de algumas horas, o Pedro disse-me: "pronto, já sei quem és". A verdade é que a canção acabou mesmo por ser o reflexo de quem eu sou.

 



Já no tema 'Viver', o Samuel Úria foi o teu grande companheiro criativo. Sei que a vossa conexão criativa foi imediata, houve logo cumplicidade, certo?

Foi um pouco assim, sim. Eu já tinha estado com o Samuel, entrevistei-o quando apresentava o Curto-Circuito, mas só o conhecia nesse registo. Quando ele começou a ajudar-me na criação da canção mostrou-se logo muito prestável. Esteve sempre disponível a ouvir-me, a querer saber o que é que eu queria transmitir com a música. O resultado foi incrível. Assim que a ouvi, comecei imediatamente a compor outras canções. O Samuel chegou para desbloquear algo em mim. Escrevi três canções de rajada depois de ouvir a 'Viver'. Aconteceu qualquer coisa quando ouvi esse tema. O meu processo criativo é assim. Escrevo quando sinto algo. Não sou como aqueles artistas que conseguem pôr o sentimento numa caixinha e fazer a música uma semana depois. Comigo isso não dá. É tudo mais imediato. O meu processo de composição para este disco foi muito imediato, muito rápido.

 

 
Tens outros convidados no disco, incluindo o improvável Nuno Markl. Como é que isto aconteceu? 

Não sei muito bem como, mas ele aceitou logo. Só precisei de dizer que precisava da ajuda dele no disco. Respondeu imediatamente que sim, nem quis saber o que é que eu tinha para lhe propor. Aceitou logo. A minha ideia inicial era ter o Markl a interromper as músicas. Depois, já na fase de estúdio, fomos acordando sobre a melhor maneira de fazer isso. Acho que o resultado do debate de ideias funcionou muito bem.

O teu disco também tem as participações do David Fonseca, do Miguel Lestre, do Luís José Martins, da Joana Espadinha e tem o Tiago Bettencourt como produtor. Há pouco já me disseste que são pessoas que admiras. Resolveste "recrutar" as tuas inspirações...

Sim, sem dúvida. Sou muito sortuda. Todos eles, sem qualquer exceção, aceitaram o convite. O que aconteceu foi que, na fase inicial do disco, quando estava a tentar encontrar um caminho para o álbum, andava a ouvir muita música portuguesa. De repente, lembrei-me de convidar as pessoas que estava a ouvir mais no Spotify. Resolvi mandar-lhes mensagens. A lista ainda era maior. Houve alguns artistas que acabaram por ficar fora do álbum apenas porque não se enquadravam tão bem no universo que queria transmitir, mas adorei conhecê-los e trabalhar com eles. Foi um processo muito leve, o que até me impressionou. Pensava que fazer colaborações era bem mais difícil. Afinal, é só tomar cafés. (risos)

Mas tinhas idealizado um papel para cada um dos músicos que convidaste ou o processo foi acontecendo, foi espontâneo?

Foi acontecendo de forma muito natural. Nunca imaginei que houvesse tanta recetividade da parte deles, até porque, às vezes, fazia os convites pelo Instagram. (risos) Demos sempre um passo de cada vez, fomos vendo o que ia acontecendo.

E como foi trabalhar com o Tiago Bettencourt? Como foi tê-lo ao lado como produtor?

O Tiago Bettencourt é muito brincalhão. Se calhar há pessoas que não têm essa percepção, mas é das pessoas mais engraçadas que eu conheço. Quando começámos a trabalhar juntos, ele dizia-me que eu era a sua fair lady e que, no final, ia sair dali com um disco. Íamos repetir a história do clássico. (risos) Ele não só cumpriu muito bem o papel de produtor como fez questão de explicar muito bem como é que as coisas funcionam. O processo acabou por ser demorado, durou cerca de dois anos, porque houve esse cuidado. Houve tempo para explorar muito bem o que eu queria fazer. Como o Tiago também estava a trabalhar num disco, tivemos de arranjar caminhos específicos para cada um, para que nenhum dos álbuns perdesse a identidade. O processo foi trabalhoso, mas foi muito divertido. Criámos uma amizade muito bonita ao longo do processo de criação do disco. 

A primeira canção que estreaste foi a 'Ter e Não Ter'. Fizeste a estreia na edição do ano passado do Festival da Canção. Qual é que foi a sensação de subir ao palco do festival sem ser como concorrente?

Estava muito mais tranquila. Não havia uma pitada de nervos porque, na verdade, estava apenas a mostrar uma canção feita por mim e que sabia de cor. Foi um pouco estranho subir ao mesmo palco, mas a sensação foi diferente. Não havia tanta expectativa, estava bem mais calma. Acho que também se notou que estava completamente apaixonada pela música. Os pulinhos que dei no palco, enquanto a cantava, denunciaram isso mesmo.  

No tema 'Quase Dança' somos surpreendidos com alguns momentos de folclore. Quem é que se lembrou disso? Foste tu?

A ideia foi minha. Essa canção foi das primeiras que mostrei ao Tiago. Na altura, ele perguntou-me se era suposto o tema ter um rancho folclórico. (risos) Eu disse que sim e, mesmo assim, ele não fugiu, o que é incrível. Eu queria que fosse uma música mais sarcástica/humorística na forma de interpretar o amor. Notoriamente, a letra é sobre o fim de uma relação, naquela fase em que estamos chateados um com o outro. O que quis fazer foi gozar um pouco com aquela pretensão que às vezes existe em algumas pessoas quando defendem os gostos musicais. Nessa lógica, achei que fazia sentido incluir na canção um género musical com o qual me identifico. Estive sempre muito envolvida com essa arte, até porque tenho familiares que fazem parte de um rancho e são precisamente eles que entram na canção. Fui a Braga de propósito gravar a parte do rancho com a minha família. Na verdade, é a minha canção preferida do álbum.

Neste disco, tens os músicos e pessoas que admiras, tens a tua família e tens o teu ukelele que é também uma extensão de quem és. Continuas a compor com o teu ukelele?

Sim, começo sempre com o ukelele. Há músicas no disco que não têm esse instrumento, mas começaram todas com o ukelele. Primeiro, acho que é o único instrumento que toco mais ou menos. As ideias fluem melhor com o ukelele. Às vezes, quero uma melodia e recorro logo ao ukelele para encontrá-la. Além de que é um instrumento muito levezinho, dá muito jeito. É muito prático para levar para qualquer lado. Não vou largar o ukulele tão cedo, mas neste álbum tentei desconstruir um pouco aquela ideia da menina que anda sempre com ukelele atrás. Neste e nos próximos discos, quero mantê-lo comigo, mas talvez de uma forma mais disfarçada.

Em relação à última canção, 'Música de Um Acorde', é mais um tema que evidencia o teu lado bem-disposto e é cantado a várias vozes. Quiseste fechar o disco com um sorriso em uníssono...

Sim, eu queria que o final fosse a celebração do próprio disco. Convidei as pessoas que fizeram parte do álbum e outras que, embora não tenham participado, estavam na minha vida durante o processo criativo. Foi uma comemoração do disco. 

O entusiasmo do Nuno Markl com o teu disco é evidente, basta espreitar as redes sociais. Que feedback é que tens recebido dos outros músicos que estão envolvidos no álbum?

Eu mandei o disco a todas as pessoas que participaram. Achei importante todos saberem onde é que o trabalho de cada um ficou encaixado. Todas as reações têm sido positivas. Acho que ficaram todos muito contentes. O melhor comentário que ouvi foi do Nuno Markl que me disse: "o teu álbum começa com uma criatura mística, um unicórnio, que aos poucos vai sendo um ser normal, adulto e crescido. Apesar disso, não perde a sua magia". Achei o comentário muito amoroso e creio que descreve na perfeição o que eu queria transmitir. Nuno Markl mais uma vez a dar tudo na exatidão.